Sou webdesigner, e trabalho com artistas em maioria. Isso significa que a maior parte dos meus clientes não tem grana (e os poucos que tem preferem fingir que não). Mas faço isso porque gosto de trabalhar em uma coisa que acredito. Então muitas vezes recebo “obras” em lugar de pagamento. E sempre digo que prefiro uma obra de arte do que um cheque que vai se perder na minha conta de banco, e acabara pagando o meu supermercado, ou algo impressioanante assim. Sei que uma pintura não paga o aluguel, nem a conta de luz. Mas será que a arte não é mais importante? O Monsieur não concorda, e briga comigo porque tenho que ser mais capitalista. Mas desde que terminei a faculdade, e mesmo durante, sempre fui capitalista. Acredito que tenho que mudar, agora ou nunca.
Por isso recebo as minhas obras, algumas melhores do que outras. Cheguei em Barcelona com 6 lindas fotos, pretas e brancas, todas imprimidas pelos próprios artistas. São importantes pra mim porque são o resultado do meu trabalho, e porque são o começo do que um dia espero, será uma coleção de arte.
Fui comprar as molduras, aquelas já feitas, porque agora que trabalho com o que acredito, a grana ficou ainda mais curta. Mas depois das molduras, faltam os passe partout... Sempre que olho pras minhas 6 fotos lembor das palavras do primeiro cliente, na hora de me entregar o “pagamento”:
- Cuidado, impressões assim são frágeis. Não se esqueça de sempre guarda-las em papel sem ácido.
Como assim, papel sem ácido? Pois é. Sabias tu que fotografias de arquivo (aquelas bem feitas que vc deseja guardar durante muitos anos) devem ficar em contato com papel de Ph neutro? Eu não sabia.
Foi nesse momento que minha neurose do ácido começou. Porque como se pode ter certeza de que o papel que vc tem é sem ácido? Se alguém te disse isso, como saber se eles não se enganaram, ou se não mentiram?
Foi assim que encuadrei a primeira foto (minha preferida) numa loja de quadros no final da minha rua. Perguntei, com meu super espanhol, se o passe partout era especial fotos, sem ácido. Mas quem já aprendeu uma língua conhece aquela sensação de que achas que ninguém esta entendendo realmente o que voce esta falando. E resolvi que o quadro (que ficou lindo) devia estar com um passe partout comum.
Pesquisei, procurei, e graças a um amigo de outro amigo fotografo, encontrei um tal lugar que trabalha com fotografos professionais, que fazem um trabalho em que (dizem) eu posso confiar.
Fui na loja. Aí encontrei um pouco de espírito espanhol. A primeira vez estava fechada (claro, siesta). A segunda, o dono não estava, e as outras 3 pessoas que trabalham na loja todos os dias, nao conheciam os preços. Como voce pode trabalhar numa loja e não conhecer os preços dos serviços que essa mesma oferece, eu não sei. Mas aqui é assim. E ainda tem o detalhe de que eles nao sabiam quando o todo poderoso dono estaria presente. Voltai mais duas vezes, dai fiquei esperta e anotei o telefone. Liguei 4 (QUATRO) vezes antes de encontrar o tal de Joel, e descobrir que os meus famosos passe partout custam uma fortuna. Mas fazer o que? Nao tenho opçao, quero cuidar das minhas fotos e dormir sem neuroses. Deixei minhas obras, depois de confirmar mais uma ou duas vezes que realmente, sim, eles trabalham com materiais sem ácido. Agora só falta perder o medo de que alguém vai perder minhas fotos, ou deixar um pouco de café cair em cima, que durmo tranquila. Sem neuroses, e proprietária de lindos quadros (mesmo sem grana pra pagar o aluguel)!